Alguns camaradas
me fizeram a seguinte pergunta: como é que eu entendo a disciplina
revolucionária? Vou lhes responder.
Compreendo a disciplina
revolucionária como uma autodisciplina do indivíduo,
estabelecida num coletivo atuante, de modo igual para todos, e rigorosamente
elaborada.
Ela deve ser a linha de
conduta responsável dos membros desse coletivo, induzindo a
um acordo estrito entre sua prática e sua teoria. Sem disciplina
na organização, é impossível empreender
qualquer ação revolucionária séria. Sem
disciplina, a vanguarda revolucionária não pode existir,
porque então ela se encontrará em completa desunião
prática e será incapaz de formular as tarefas do momento,
de cumprir o papel de iniciador que dela esperam as massas.
Faço repousar esta
questão sobre a observação e a experiência
de uma prática revolucionária conseqüente. De minha
parte, baseio-me sobre a experiência da revolução
russa, que tinha um conteúdo tipicamente libertário
sob muitos aspectos.
Se os anarquistas estivessem
firmemente ligados no plano organizativo e tivessem observado, em
suas ações, uma disciplina bem determinada, não
teriam jamais sofrido uma tal derrota. Mas, porque os anarquistas
"de todo estilo e de todas as tendências" não
representavam, mesmo em seus grupos específicos, um coletivo
homogêneo, com uma disciplina de ação bem definida,
não puderam suportar o exame político e estratégico
que lhes impuseram as circunstâncias revolucionárias.
A desorganização
conduziu os anarquistas à impotência política,
dividindo-os em duas categorias:
- a primeira foi a dos
que se dedicaram à sistemática ocupação
das residências burguesas, nas quais se alojaram e viveram para
o seu bem-estar. Eram os que eu chamo de turistas, os diversos anarquistas
que vão de cidade em cidade, na esperança de encontrar
um lugar onde permanecer algum tempo, espreguiçando-se e desfrutando
o máximo possível de conforto e prazer.
- a segunda se compunha
dos que romperam todos os laços honestos com o anarquismo (ainda
que alguns deles, na URSS, façam-se passar agora pelos únicos
representantes do anarquismo revolucionário) e se lançaram
sobre os cargos oferecidos pelos bolcheviques, no momento mesmo em
que o poder fuzilava os anarquistas que permaneciam fiéis ao
seu posto de revolucionários e denunciaram a traição
dos bolcheviques.
Diante desses fatos, compreende-se
facilmente porque eu não posso continuar indiferente ao estado
de despreocupação e negligência que existem atualmente
em nossos meios.
De uma parte, isso impede
a criação de um coletivo libertário coerente,
que permitirá aos anarquistas ocuparem o lugar que lhes cabe
na revolução. Doutra parte, isso permite contentar-se
com belas frases e grandes pensamentos, omitindo-se no momento de
agir.
Eis porque eu falo de
uma organização libertária apoiada sobre o princípio
duma disciplina fraternal. Uma tal organização conduzirá
ao acordo indispensável de todas as forças vivas do
anarquismo revolucionário e o ajudará a ocupar seu lugar
na luta do Trabalho contra o Capital.
Por esse meio, as idéias
libertárias certamente ganharão as massas e não
se empobrecerão. Somente os fanfarrões consumados e
irresponsáveis fugirão diante de uma tal estrutura organizacional.
A responsabilidade e a
disciplina organizacionais não devem horrorizar: elas são
companheiras de viagem da prática do anarquismo social.
Nestor Makhno - Dielo
Trouda, n° s 7-8, dezembro de 1925 – janeiro de 1926.