Análise do Debate Sobre Kronstadt 06/03

Nosso debate sobre Kronstadt teve seu eixo principal sobre o acúmulo revolucionário desta cidade. Lembremos que a Revolução Russa não começou em 1917, mas sim é parte de um processo que podemos datar com maior ênfase em 1905. Lembremos que o acontecimento mais marcante deste ano atribulado ocorreu na vizinha Petrogrado, numa covarde repressão dos homens do czar sobre a população descontente. Neste mesmo ano foi criado o primeiro soviete de que se tem notícia, também em Petrogrado, e ocorreram levantes da armada, entre os quais encontramos o imortalizado encouraçado Potenkin, no Mar Negro, e no Mar Báltico, na própria Kronstadt, onde entre os navios rebelados estava ele mesmo, o encouraçado Sevastopol, o mesmo de 1921. Foi principalmente durante os descontentamentos de 1905 que uma cultura revolucionária que vinha da Europa Ocidental e que até ali ainda encontrava muitas dificuldades de sair dos círculos intelectuais, encontrou campo fértil. Recordemos desta tradição as lições do "1848" francês e da Comuna de Paris, isto para citar apenas o caso da  França. Antes de 1905, os intentos do meio revolucionário na Rússia estavam bastante limitados ao campo dos atentados políticos, não havendo encontrado suficiente espaço popular. Justiça seja feita a iniciativas como a dos populistas russos, que foram ao campo buscando na própria cultura camponesa eslava o espírito socialista.

Foram justamente em cidades como Kronstadt e Petrogrado que o "1905" russo teve seguramente maior  repercussão. À experiência de luta da Armada neste período, e dos trabalhadores somou-se a atividade de pequenos grupos de diferentes tendências socialistas criando um ambiente propício de acúmulo revolucionário que irá justamente culminar na derrubada do absolutismo e posteriormente do próprio czar num curto período de tempo, junto com as tendências tanto aristocratas quanto burguesas da elite. Em 1917 as condições estavam propícias para uma grande transformação na Rússia. O descontentamento atingia seu limite e a soma da tradição revolucionária às classes populares vinha criando uma arraigada cultura classista. Praticamente seguido à derrubada do absolutismo, deu-se a derrubada do novo regime político, a Duma. Pouco tempo durou portanto o parlamento burguês. É um disparate falar apenas em fraqueza da burguesia. Rapidamente houve inúmeras expropriações e haviam se espalhado pela Rússia uma rede de conselhos populares, os sovietes. Uma iniciativa tão grandiosa da população não poderia ter sido tomada sem o devido acúmulo de forças da classe trabalhadora. A burguesia não caiu, foi derrubada. E lá estavam trabalhadores, marujos e soldados de Kronstadt novamente. O que queriam? Todo o Poder aos Sovietes. E ao perceberem após três anos e meio a ameaça bolchevique às suas aspirações, não hesitaram em voltarem à luta. E de onde viria tamanha clareza de propósitos, tamanha identidade de classe? Em Kronstadt respiravam-se as inúmeras flores do socialismo, da revolução, havia anos semeadas. Suas demandas e seu desejo revolucionário tinham muita história e muito sangue para poder-se quiçá pensar em desistir.

Kronstadt!! A seguir seus Passos.

Coletivo de Estudos Anarquistas Domingos Passos, março de 2002