Apresentação das Lutas das Mulheres em Chiapas

Com uma militante feminista que permaneceu durante um ano em Chiapas e que fará a apresentação do tema:

As lutas das mulheres em Chiapas

Chiapas, México : atualidade do conflito

Lembrem-se, ouvimos falar há já quase 8 anos, quando os Índios se ergueram em armas no seio do EZLN (Exército Zapatista de Libertação Nacional) contra o neoliberalismo e por sua autonomia. Reteve-se sobretudo a figura de Marcos ou dos gorros míticos, estas imagens vazias que convêm aos média para reduzir este largo movimento revolucionário a um episódio romântico. Pôde-se eventualmente seguir de longe a evolução do conflito e sentir um choque com a notícia do massacre de 45 Índios em Acteal, em Dezembro de 1997. Em seguida perdeu-se o fio á meada: diálogo, não-diálogo, silêncio. Silêncio dos média pelo menos. As guerras de "baixa intensidade" são menos espetaculares que as guerras "clássicas" visto que seu objetivo principal é de não aparecerem como uma guerra. Eis a razão porque não se sabe, em geral, que Chiapas continua sendo um estado ocupado no seio do México (encontra-se aí um terço do exército mexicano), que os acordos sobre as exigências do movimento, assinados pelo governo há quase 6 anos, ficaram letra morta e são todos os dias postos em causa, que se cometem violações contra as mulheres índias com toda a impunidade, que duas comissões civis (uma terceira está a caminho) redigiram relatórios sobre a violação dos direitos humanos em Chiapas e sobre a necessidade de um relator especial da ONU sem nunca serem escutadas, que a União Européia fecha os olhos e assina tratados de comércio livre com o governo mexicano, etc. Muitas coisas são freqüentemente ignoradas.

E sobretudo acerca do quotidiano das resistência Indígena.

Hoje esta resistência contínua, evolui e está a dar os seus frutos. A autonomia constrói-se apesar da repressão, nas aldeias e nos bairros zapatistas. Escolas, clínicas, cooperativas de agricultura e de artesanato, fóruns políticos, seminários de educação popular: as práticas de autogestão e solidárias que floresceram em Chiapas nestes 8 últimos anos são incontáveis. No princípio do ano passado, o movimento provou novamente a sua força de mobilização social ao organizar uma ampla « marcha zapatista » até à cidade de México para obrigar os poderes legislativos a pronunciar-se sobre os direitos dos Índios. Disto, talvez se tenha ouvido falar, os médias apreciaram: "Marcos sai da floresta". Pelo contrário, nada soubemos acerca dos desenvolvimentos desta mobilização: os legisladores votaram uma lei sobre os direitos dos Índios que vai ao encontro das reivindicações. Porém o exército não se retirou mas deslocou-se dentro do Estado de Chiapas, os corpos policiais aumentaram, as comunidades zapatistas são regularmente vítimas de agressões ou de intimidações militares, uma parte dos/prisioneiros/as continua por libertar, dão-se regularmente novas prisões e o governo vai ainda mais longe nas políticas neoliberais, impondo zonas "de livre comércio" na América Central para que as multinacionais possam melhor explorar o trabalho e a terra. Quanto aos/às militantes feministas, pró-zapatistas ou pelos direitos humanos, são vítima de assassinatos, de violações, de ameaças de morte, são agredidos/as, raptadas/os, seguidos/as, controlados/as, cadastradas/os, etc.


LUTAS DAS MULHERES EM CHIAPAS

Porque é que a luta das mulheres está no centro do movimento zapatista ?

É impossível compreender o movimento zapatista e a luta dos Índios de Chiapas sem falarmos da luta das mulheres. A começar pelo fato de que a história da insurreição zapatista assenta em grande parte na organização das mulheres índias. Muito antes de se ouvir falar de zapatistas, um movimento de cooperativas de artesãs e de agricultoras tinha aparecido nas regiões com forte povoamento índio, cuja finalidade primária era sobreviver face ao neoliberalismo. A organização das mulheres em cooperativas impulsionou uma prática de resistência e de autogestão no quotidiano, pela qual as mulheres tomavam o espaço político reservado aos homens opunham-se a políticas autoritárias, paternalistas e racistas do Estado. A construção progressiva de redes dessas cooperativas assim como uma coordenação cada vez mais ampla das organizações das mulheres índias entre si e com o movimento feminista, constituíram a sólida base social para a insurreição zapatista.

Qual é hoje o peso das mulheres na resistência dos Índios?

Atualmente são precisamente as mulheres índias que formam a principal base civil do movimento zapatista. Pelas suas redes de cooperativas que se vão alargando, garantem a mobilização política e muitas vezes o apoio econômico do EZLN. Também participam nas manifestações, nos cortes de estradas ou nas ocupações, onde elas usam da sua força civil contra os militares. O levantamento armado do EZLN difere dos movimentos de guerrilha anteriores pois a sua ação se baseia essencialmente na mobilização das bases de apoio e da "sociedade civil", isto é de camponeses/as milicianos/as, assim como das múltiplas organizações políticas e dos/as militantes simpatizantes. Uma grande parte deste trabalho de base é levado a cabo por mulheres, tanto nas comunidades índias como nas cidades, onde são mulheres (mexicanas e estrangeiras) que se mostram mais empenhadas no movimento zapatista. Por fim, as mulheres índias têm também graduações e responsabilidades nas instâncias militares e políticas do EZLN, nas quais exigiram a realização da lei revolucionária das mulheres, uma declaração elaborada pelas mulheres das comunidades e garantindo a igualdade entre mulheres e homens.

De que maneira as mulheres de Chiapas nos dão idéias para o combate feminista, anti-racista e pela autonomia?

A organização e a participação crescente das mulheres índias no movimento Zapatista tende a transformar as práticas no seio das comunidades. As mulheres tomam consciência dos seus direitos, reivindicam o espaço público e aproximam-se dos conceitos do feminismo. A sua luta é radical, pois põe em causa o sistema patriarcal assim como o capitalismo, as relações Norte-Sul e o racismo contra os Índios. A sua prática de luta passa pela construção de autonomia nos diverso domínios da vida social, como a produção e preparação de alimentos, o conhecimento e o uso das plantas medicinais, a confecção de difusão de artesanato, a gestão da educação, etc. Enquanto mulheres, enquanto militantes feministas e anti-capitalistas, podemos identificarmo-nos com o seu combate e sobretudo Recolhermos inspiração para pormos de pé, nós também, os nossos espaços autônomos.

Extraído da página da OSL

 

http://www.rebellion.ch