Mumia Abu Jamal comenta os ataques

 

"Porque nos odeiam tanto?"

Para Abu-Jamal, é preciso ter presente que "os voos suicidas de Nova Iorque, Washington e Pensilvânia tiveram a sua origem nas montanhas do Afeganistão, na guerrilha, longa de dez anos contra a então União Soviética". Recorda depois que a CIA se envolveu nessa guerra e que os EUA investiram nela milhões de dólares, para depois votarem o país ao abandono e à guerra civil.

Os EUA menosprezam hoje o Afeganistão como o mundo menosprezou a Alemanha nos anos 20.

"A humilhação, sentimento com o qual o mundo islâmico teve de familiarizar-se desde a queda do império otomano em 1922 e com a era colonial até à segunda metade do século XX, constitui uma força poderosíssima. Ela levou os alemães, humilhados, até à beira da conquista do mundo depois da Primeira Guerra Mundial", afirma Mumia Abu-Jamal em artigo publicado no diário italiano "Il Manifesto" de 25 de Setembro. E acrescenta: "Não é coisa para encarar com ligeireza. O Afeganistão poderia levar a outro ponto de viragem na História do mundo e por essa razão todos devemos aprender a conhecê-lo".

Mas a comparação entre a Alemanha e o Afeganistão limita-se aos efeitos devastadores que pode ter para o mundo o potencial explosivo acumulado em ambos os países naqueles dois momentos diferentes das Histórias respectivas. Para Abu-Jamal, é preciso ter presente que "os voos suicidas de Nova Iorque, Washington e Pensilvânia tiveram a sua origem nas montanhas do Afeganistão, na guerrilha, longa de dez anos contra a então União Soviética". Recorda depois que a CIA se envolveu nessa guerra e que os EUA investiram nela milhões de dólares, para depois votarem o país ao abandono e à guerra civil. E cita um antigo diplomata norte-americano no Paquistão, que reconhecia, em tom auto-crítico, que "os nossos objectivos não eram a paz e o desenvolvimento do Afeganistão. O nosso objectivo era matar comunistas e expulsar os russos".

Com a vitória sobre as tropas russas, os afegãos encontraram-se com um país que continuava a ter uma taxa de alfabetização de apenas 29%, com uma esperança média de vida de 46 anos para os homens e de 45 para as mulheres e, olhando à sua volta, com um mundo em que os invasores norte-americanos tinham substituído os soviéticos, controlando como protectorado seu a Arábia Saudita e os seus lugares sagarados, arrasando o Iraque, protegendo a violência israelita sobre a população palestiniana refém.

Tudo isto ajudaria, segundo Abu-Jamal, a encontrar uma resposta para a mulher norte-americana que, olhando as ruínas das torres gémeas, perguntava desesperada , "Porquê, porquê nos odeiam tanto?".

Mumia Abu-Jamal é um antigo membro do Partido dos Panteras Negras que, depois da dissolução do movimento, se tornou um dos jornalistas mais populares de Filadélfia com o seu programa de rádio "A voz dos sem-voz". No decurso de um incidente no início dos anos 80, foi preso, acusado de ter baleado mortalmente um polícia, julgado sem lhe ser permitido defender-se ou assistir ao seu julgamento, e finalmente condenado à morte. A sua execução chegou a estar marcada há dois anos, mas um importante movimento de opinião nacional e internacional a seu favor, obteve um adiamento. Neste momento Abu-Jamal trava uma batalha judicial para conseguir que o tribunal se disponha a ouvir a confissão de um outro preso que entretanto admitiu ter cometido o assassínio atribuído ao jornalista. Foi do corredor da morte que escreveu o artigo aqui citado.

Mumia Abu Jamal

A ZINE, 2001