Uma Noite Com Noam Chomsky
18
de Outubro de 2001 - Transcrição de uma palestra conferida
no Fórum de Tecnologia e Cultura, realizado no Instituto
de Tecnologia de Michghan (MIT)
Todos sabem que é
o pessoal da TV que governa o mundo [platéia ri]. Acabei
de receber um ultimato obrigando-me a estar aqui e não lá.
Bem, a última palestra que apresentei aqui nesse forum foi
sobre um tópico bem mais agradável. Era sobre como
nós, os homens, somos uma espécie em extinção
e, dada a natureza de nossas instituições, estamos
possivelmente bastante próximos de nos destruirmos a nós
mesmos em pouquíssimo tempo. Agora podemos respirar aliviados,
uma vez que o tópico de hoje ainda mais agradável:
a nova guerra contra o terrorismo. Infelizmente, o mundo continua
nos oferecendo coisas que o fazem cada vez mais terrível
à medida que o tempo passa.
Eu vou considerar duas condições
básicas para essa palestra.
A primeira delas é
o que eu considero ser o reconhecimento do fato. Isto é,
que os eventos de 11 de setembro foram uma atrocidade terrível,
provavelmente o incidente mais devastador em toda a história
do crime, fora a guerra. A segunda condição tem a
ver com com os objetivos. Estou considerando que nosso objetivo
é reduzir a probabilidade de tais crimes, sejam eles contra
nós ou contra qualquer outra pessoa. Se alguém não
aceitar tais condições, então o que eu vou
dizer não está direcionado a essa pessoa. Se todos
aqui aceitam-nas, então inúmeras questões podem
ser levantadas, que merecem bastante reflexão.
Uma questão, e sem
dúvida a mais importante, é: o que está acontecendo
nesse exato instante? Implícita nela está outra questão:
o que podemos fazer a respeito? A segunda tem a ver com o reconhecimento
de que o que ocorreu em 11 de setembro é um evento histórico,
um evento que mudará a História. Estou para concordar
com isso. Penso ser verdade. Foi um evento histórico e a
pergunta que devemos fazer é: por quê? A terceira pergunta
tem a ver com o título "A Guerra Contra o Terrorismo".
O que é isso exatamente? E há uma outra pergunta relacionada
a essa última: o que é terrorismo? A quarta questão,
que é mais restrita mas igualmente importante tem a ver com
as origens dos crimes de 11 de setembro. E a quinta questão
sobre a qual quero falar um pouco é que quais são
as opções que temos para lutar contra o terrorismo
e lidar com as situações que o propiciam.
Bem, vamos começar.
Falarei sobre a situação no Afeganistão. Eu
me limitarei apenas a fontes incontroversas, como o New York Times
[platéia ri]. De acordo com o New York Times, há no
Afeganistão um total de 7 ou 8 milhões de pessoas
beirando a fome. Essa situação é verdadeira
mesmo antes de 11 de setembro. Eles sobrevivem com ajuda de instituições
internacionais. Em 16 de setembro a revista Times reportou que os
EUA obrigaram que o Paquistão impedissem a entrada dos caminhões
com provimentos de comida e outros mantimentos no Afeganistão.
Pelo que pude averigüar, não houve nenhuma manifestação
acerca disso nos EUA ou, por essa razão, na Europa. Esse
assunto esteve em cadeia de radio nacional na Europa no dia seguinte.
Não houve nenhum tipo de manifestação nos EUA
ou na Europa, pelo que sei, para impedir essa imposição
de matança massiva por fome de milhões de pessoas.
A ameaça de ataques militares logo após os acontecimentos
de 11 de setembro forçou a remoção de funcionários
de ajuda internacional que trabalhavam em programas de assistência.
Na verdade, estou novamente citando o New York Times. A imagens
de refugiados alcançando o Paquistão depois de longas
e penosas jornadas do Afeganistão eram cenas descritas como
sendo de desespero e medo, à medida em que a ameaça
de ataques liderados pelos EUA iam tornando os seus sofrimentos
já antigos em uma catástrofe potencial. O país
estava na beira de um precipício e nós o empurramos,
citando um funcionário de ajuda que fora evacuado, tal como
transcrito no New York Times.
O Programa Mundial da Comida
da ONU, que é o principal entre os que lá existem,
puderam retomar os serviços depois de três semanas,
no início de outubro. Começaram devagar, dando continuidade
à remessa de alimentos. Eles já não tinham
funcionários de ajuda internacionais no Afeganistão,
de forma que a distribuição dos alimentos foi paralizada.
Isso foi feito assim que os bombardeios começaram. Puderam
depois dar continuidade ao programa, mas de forma bem mais precária,
enquanto as agências de ajuda começaram a levantar
a voz condenando a iniciativa dos EUA de jogarem mantimentos pelo
ar no Afeganistão, condenando-os como elementos de propaganda
que traziam muito mais malefícios que benefícios.
Depois da primeira semana de bombardeamento, o New York Times notou,
numa página secundária, em apenas uma linha, num artigo
sobre qualquer outra coisa, que pela aritimética da ONU haverá
dentro em breve 7.5 milhões de afegãos em necessidade
extrema por até mesmo um pedaço de pão, e que
dentro de poucas semanas o inverno rigoroso fará com que
a entrega de alimentos em determinadas áreas seja totalmente
impossível, mas que - ainda no mesmo artigo - com o bombardeamento,
a entega não deve chegar à metade do que se precisa.
Um comentário casual. Que nos diz que a civilização
ocidental está antecipando a matança de - é
só fazer os cálculos - 3 ou 4 milhões de pessoas
ou algo assim. No mesmo dia, o líder da civilização
ocidental negou com desprezo, uma vez mais, as ofertas de negociação
pela entrega do alvo alegado, Osama bin Laden, sob a entrega de
alguma evidência para substanciar a demanda pela rendinção
total. Isso foi negado. No mesmo dia a Porta-Voz oficial da ONU
encarregada pela distribuição de alimentos implorou
aos EUA que parassem o bombardeio no intuito de salvar milhões
de vítimas. Pelo que sei, tal pedido sequer foi considerado.
Isso foi numa segunda-feira. No dia 17 de outubro várias
outras organizações juntaram-se à ONU no pedido
de encerramento dos bombardeios. Isso não aparece no New
York Times, mas é mencionado no Boston Globe, dentro de uma
reportagem sobre outro tópico.
Bem, podíamos facilmente
continuar, mas tudo isso nos mostra antes de tudo o que está
acontecendo. Parece que o que está acontecendo é um
tipo de genocídio silencioso. Esses fatos também nos
mostram a reação da cultura de elite dos EUA, uma
cultura em que estamos inseridos. Eles indicam que não sabemos
exatamente o que vai acontecer, mas que existem planos sendo feitos
e programas implementados que podem levar à morte de vários
milhões de pessoas nas próximas semanas... bastante
casualmente, sem direito a comentário ou reflexões;
é algo tipo normal, aqui e em boa parte da Europa. Não
no resto do mundo. Na verdade, nem mesmo na maior parte da Europa.
Assim, se vocês lerem os jornais irlandeses ou os jornais
escoceses... tão próximos, as reações
variam enormemente. Bom, isso é o que está acontecendo
nesse exato minuto. O que está acontecendo está sob
nosso controle. Podemos fazer bastante para mudar o que está
acontecendo. E é basicamente isso.
Discutamos agora uma questão
um pouco mais abstrata, esquecendo por uns instantes que estamos
vivenciando íncolumes a matança de 3 ou 4 milhões
de pessoas. Voltemos à questão do evento histórico
que ocorreu no dia 11 de setembro. Como eu disse, acho que é
assim. Foi um evento histórico. Não, infelizmente,
por conta de sua escala, desagradável até em pensar.
Entretanto, em termos da escala, ele não é assim tão
incomum. Eu disse que é o pior... provavelmente o pior dos
piores crimes contra a humanidade. E isso pode ser verdade. Mas
há crimes terroristas que são mais extremos, infelizmente.
Ainda assim, é um evento histórico porque houve uma
mudança. A mudança foi a direção para
a qual as armas estavam apontadas. Isso é novo. Radicalmente
novo. Vejamos a história dos EUA.
A última vez que o
território nacional dos EUA foi atacado ou ameaçado
foi quando os britânicos ataram fogo em Washington em 1814.
Houve vários outros casos... É comum citarem Pearl
Harbor, mas essa analogia não é muito boa. Os japoneses
bombardearam bases militares em duas colônias norte-americanas,
e não o território nacional; colônias que foram
tomadas de seus habitantes naturais de uma forma nada simpática.
Essa é a primeira vez que o território americano foi
atacado em larga escala. Pode-se até encontrar exemplos menores;
mas esse ataque é único.
Durante os últimos
200 anos, nós, os EUA, despojamos, ou invariavelmente exterminamos
a população indígena local - isso significa
muitos milhões de pessoas, conquistamos a metade do México,
depedramos a região da América Central e Caribenha,
algumas vezes além, conquistamos o Havaí e as Filipinas,
matando vários 100.000 filipinos no processo. Desde a Segunda
Grande Guerra, os EUA têm extendido seus domínios ao
redor do mundo de uma maneira que eu não preciso descrever.
Mas sempre matando alguém, as lutas sempre foram em outros
lugares. Não aqui. Não em território nacional.
No caso da Europa, a mudança
é ainda mais dramática porque sua história
é ainda mais horrível que a nossa. Nós somos
basicamente um produto da Europa. Por centenas de anos, a Europa
tem dizimado povos em todo o mundo. Foi desse modo que eles conquistaram
o mundo; não foi dando doce a crianças. Durante esse
período, a Europa de fato sofreu com guerras sangrentas,
mas uma guerra em que assassinos europeus se matavam mutuamente.
O principal esporte da Europa durante centenas de anos foi o genocídio.
A única razão pela qual tal esporte saiu de moda em
1945 foi... não teve nada a ver com democracia ou paz ou
outra noção similar. Tinha a ver com o fato que todo
mundo entendeu que da próxima vez que jogassem esse jogo,
seria o fim do mundo. Porque os europeus, e mesmo os americanos,
tinham desenvolvido armas de destruição tão
potentes que aquele jogo tinha mesmo de ser descartado. E esses
fatos são mais antigos do que pensamos. No Século
XVII, cerca de 40% da população da Alemanha foi aniquilada
em apenas uma guerra.
Mas durante todo esse período
de assasinatos sangrentos, tudo se deu assim: europeus matando uns
aos outros, e europeus matando povos fora da Europa. O Congo não
atacou a Bélgica, a Índia não atacou a Inglaterra,
a Algeria não atacou a França. É uniforme.
Há algumas pequenas exceções, mas bastante
insignificantes em escala, certamente invisivel na escala do que
a Europa e os EUA têm feito no resto do mundo. Essa é
a primeira mudança. A primeira vez que as armas foram apontadas
para o lado oposto. E na minha opinião essa é provavelmente
a razão pela qual estamos vendo reações tão
divergentes nos dois lados do Mar Irlandês. Tenho notado isso
em muitas entrevistas em ambos os lados. O mundo pode parecer bastante
diferente, dependendo de que lado você está: dos que
estão com o chicote ou dos que estão apanhando por
centenas de anos. Muito diferente. Desse modo, eu penso que o choque
e a surpresa na Europa e nos EUA são bastante compreensíveis.
É um evento histórico, apesar de não sê-lo
em escala, mas em algo diferente. E essa é a razão
pela qual o resto do mundo... a maior parte do resto do mundo olha
para esse evento de maneira tão diferenciada. Não
que não simpatizem com as vítimas das atrocidades
ou estejam horrorizadas com elas, isso é quase uniforme,
mas vendo os fatos de uma perspectiva diferente. Algo que deveríamos
tentar entender.
Bom, vamos agora para a terceira
questão, "o que é a guerra contra o terrorismo?"
e uma outra questão relevante: "o que é terrorismo?"
A guerra contra o terrorismo tem sido descrita como uma batalha
contra uma praga, um câncer que está sendo espalhado
por um povo bárbaro, por "oponentes inescrupulosos da
civilização". Esse é um sentimento que
eu compartilho. As palavras que estou citando, no entanto, são
de 20 anos atrás. São as palavras do presidente Reagan
e de sua Secretaria do Estado. A administração Reagan
chegou ao poder há 20 anos declarando que o ponto central
de sua política internacional seria a guerra contra o terrorismo
internacional. Essa mesma administração começou
sua empreitada contra a praga disseminada por openentes inescrupulosos
da civilização criando uma rede de terrorismo internacional
extraordinária, totalmente sem precedentes em escala, que
foi responsável por atrocidades em massa por todo o mundo.
Não vou entrar em detalhes acerca disso. Vocês estão
todos cientes disso; tenho certeza que aprenderam tudo direitinho
na escola. [platéia ri]
Mas vou mencionar um caso
que é totalmente incontroverso, de modo que não precisemos
sequer arguir sobre a validade dele, que não chega a ser
de modo nenhum o mais extremo, mas sem dúvida incontroverso.
Ele é inconroverso por conta dos julgamentos das maiores
autoridades internacionais do Corte Internacional de Justiça,
a Corte Mundial, e do Conselho de Segurança da ONU. Então
esse caso é incontroverso, pelo menos para pessoas que têm
um mínimo de respeito por leis internacionais, direitos humanos,
justiça e coisas assim. E agora vou propor a vocês
uma tarefa de casa. Vocês podem ter uma estimativa do tamanho
da categoria desse caso se simplesmente fizerem uma pesquisa da
quantidade de vezes que esse caso incontroverso tem sido citado
nos últimos dias. E é um caso particularmente relevante,
não somente porque é incontroverso, mas porque oferece
um precedente de como um estado coberto por leis internacionais
trataria... de fato tratou o terrorismo internacional, o que é
incontroverso. E esse caso foi ainda mais extremo que os eventos
de 11 de setembro. Estou falando da guerra americana de Reagan contra
a Nicarágua, que deixou dezenas de milhares de pessoas mortas,
o país arruinado, talvez até impossível de
se reerguer.
A Nicarágua respondeu
a esses ataques. Mas não lançando bombas em Washington.
A resposta foi levar o caso à Corte Mundial; não tiveram
nenhum problema em apresentar evidências. A Corte Mundial
aceitou o caso, julgou em favor da Nicarágua e condenou os
EUA pelo "uso ilegal de força", o que é
um outro nome para terrorismo internacional, ordenou que os EUA
parassem o crime e que pagassem os danos que causaram. Os EUA obviamente
desconsideraram a corte com total desprezo e anunciou que não
aceitaria ser julgada por ela daí por diante. A Nicarágua
então recorreu ao Conselho de Segurança da ONU, que
demandou todos os Estados a considerarem as leis internacionais.
Nenhum estado em particular foi mencionado, mas todos sabiam a que
estado a ONU se referia. Os EUA desconsideraram a resolução.
Os EUA são agora o único país que não
apenas foi condenado pela Corte Mundial por terrorismo internacional,
mas também desconsiderou uma resolução do Conselho
de Segurança ordenando que todos os estados devem obedecer
as leis internacionais. A Nicarágua foi então para
a Assembléia Geral onde tecnicamente as resoluções
não podem ser desconsideradas, mas um voto negativo dos EUA
acarretaria na desconsideração. A resolução
da Assembléia Geral foi basicamente a mesma, opondo-se a
ela apenas os EUA, Israel e El Salvador. No ano seguinte, os EUA
puderam contar somente com Israel na opisição, de
modo que dois votos se opuseram à observação
da lei internacional. Naquele ponto, não havia mais nada
que a Nicarágua pudesse fazer dentro da lei. O país
havia tentado todas as medidas possíveis. Medidas que não
funcionam num mundo gerido pela força.
Esse caso é incontroverso,
mas não é de modo nenhum o mais extremo. Ganharíamos
um conhecimento sem par acerca de nossa cultura e sociedade e acerca
do que está acontecendo agora se nos perguntássemos
"o quanto sabemos acerca disso? o quanto falamos sobre isso?
o quanto aprendemos sobre essas coisas na escola? o quanto tais
assuntos ocupam a primeira página dos jornais?" E isso
é apenas o começo. A resposta dos EUA à Corte
Mundial e ao Conselho de Segurança foi a imediata organização
de uma guerra. Incidentalmente, essa era uma guerra que envolvia
duas partes. Os termos dessa guerra também mudaram. Pela
primeira vez houve ordens oficiais... ordens oficiais ao exército
terrorista para atacar o que chamaram "soft targets",
ou alvos compostos por civis sem defesa, e para manterem-se afastados
do exército da Nicarágua. Eles puderam fazer isso
porque os EUA tinha controle total do ar por sobre a Nicarágua
e o exército mercenário foi armado com equipamentos
de comunicação avançados. Não era um
exército de guerrilheiros, no sentido normal da expressão
e podiam receber instruções acerca do posicionamento
das forçar armadas da Nicarágua, de forma que podiam
atacar comunidades agriculturais, clínicas de saúde,
etc. "Soft targets" que não acarretavam em qualquer
tipo de punição. Essas ordens foram ordens oficiais.
Qual foi a reação
nos EUA? Foi sabida. Houve uma reação sobre esses
acontecimentos. A medida foi considerada como sensata pela opinião
de liberais da esquerda. Michael Kinsley, representante da esquerda
na discussão, escreveu um artigo em que diz que não
devíamos criticar a medida de forma tão leviana como
o Human Rights Watch tinha acabado de fazer. Ele disse que uma "medida
sensata" tem de "levar em conta o teste de análise
de custo-benefício" -- isto é, estou citando
agora, que é a análise da "quantidade de sangue
e sofrimento que decorrerá, e a probabilidade de que a democracia
vencerá no final das contas". Democracia tal como os
EUA entendem o termo, que é geograficamente ilustrado nos
países ao redor. Notem que é axiomático o fato
de que os EUA, as elites americanas, é que possuem o direito
de conduzirem tal análise e de levarem a cabo tais medidas
se os testes mostrarem que assim deve ser. Os testes foram de fato
positivos. Funcionou. Quando a Nicarágua finalmente sucumbiu
aos ataques super-poderosos, os comentaristas aberta e alegramente
comemoraram o sucesso dos métodos que foram adotados e descreveram-nos
com fidelidade. Eu vou citar a revista Time apenas como um exemplo.
Eles comemoraram os métodos adotados "para acabar com
a economia e posicionar-se contra uma guerra longa e mortal que
duraria até que os nativos tirassem o governo do poder pelas
próprias mãos", com um custo para os EUA que
são "mínimos", deixando a vítima
"com pontes estraçalhadas, estações de
energia sabotadas, e fazendas arruinadas", e desse modo proporcionando
ao candidato dos EUA "uma causa ganha": terminando assim
com o "empobrecimento do povo da Nicarágua." O
New York Times publicou um artigo sobre o assunto com o seguinte
título "Unidos na Alegria".
Essa é a cultura em
que vivemos e ela nos revela vários fatos. Um é o
fato de que o terrirismo funciona. Ele não falha. Funciona.
Violência geralmente funciona. Essa é a história
do mundo. Ademais, é um erro analítico sérip
dizer, como usualmente é dito, que o terrorismo é
a arma dos fracos. Como outras formas de violência, o terrorismo
é primariamente a arma dos fortes, majoritariamente, de fato.
É considerado ser a arma dos fracos porque os fortes também
controlam os sistemas doutrinais e o terrorismo que fazem não
é considerado como tal. Isso é quase universal. Não
sei de nenhuma exceção histórica, até
os piores assassinos de massa vêem o mundo assim. Consideremos
os nazistas. Eles não estavam fazendo terrorismo na Europa
ocupada. Estavam protegendo a população local do terrorismo
dos partidários. E como outros movimentos de resistência,
havia terrorismo. Os nazistas estavam lutando contra o terror. Ademais,
os EUA essencialmente concordaram com isso. Depois da guerra, as
forças armadas dos EUA fizeram estudos das operações
anti-terror dos nazistas na Europa. Primeiramento devo dizer que
os EUA se apossaram desse conhecimento e começaram a colocá-lo
em prática, freqüentemente contra os mesmos alvos, a
antiga resistência. Mas os militares também estudaram
os métodos nazistas, publicando estudos interessantes, algumas
vezes críticos, porque muitos dos métodos não
eram corretamente utilizados; então uma análise crítica:
não fizeram isso bem-feito, fizeram aquilo bem-feito. Esses
métodos todavia, com o conselho dos oficiais do Wermacht
que foram trazidos paros EUA, tornaram-se o manual de contra-insurgência,
de anti-terror, de conflito de baixa intensidade, como são
chamados. E esses são os manuais e os procedimentos que estão
sendo usados. Então não é apenas o fato que
os nazistas fizeram o que fizeram, mas que suas ações
foram consideradas pelos líderes da civilação
ocidental - isto é, nós - a coisa certa a fazer. E
então tratamos de fazê-los nós mesmos. O terrorismo
não é a arma dos fracos. É a arma daqueles
que estão contra nós, quem quer que sejamos. E se
puderem achar uma exceção histórica para isso,
ficarei interessado em conhecer.
Bem, uma indicação
interessante da natureza de nossa cultura, ou alta cultura, é
o meio como isso tudo é considerado. Um desses meios é
a eliminação de informação. Assim ninguém
jamais ouviu falar nisso. E o poder da propaganda e doutrina americanas
é tamanho que mesmo entre as vítimas esses fatos são
quase desconhecidos. Quero dizer, quando se fala acerca disso para
as pessoas na Argentina, é preciso lembrá-los. Ah,
sim, isso aconteceu, nós esquecemos disso. A informação
é profundamente eliminada. As conseqüências do
monopólio da violência podem ser bastante poderosas
em termos ideológicos e em outros termos.
Bom, uma aspecto luminar
de nossa própria atitude no que diz respeito ao terrorismo
é a reação à idéia de que a Nicarágua
tinha o direito de se defender. Na verdade, eu investiguei esse
ponto em detalhe com buscas em bancos de dados e esse tipo de coisa.
A idéia de que a Nicarágua tivesse o direito de se
defendr era considerada ultrajante. Não há absolutamente
nada nos comentários da mídia em evidência indicando
que a Nicarágua podia ter tal direito. E esse fato foi explorado
pela administração Reagan e sua propaganda de uma
maneira bastante interessante. Aqueles entre vocês que viveram
esse período lembrarão que eles periodicamente lançavam
rumores que a Nicarágua estava recebendo jatos MIG da Russia.
Na época, os gaviões e as pombas se opuseram. Os gaviões
diziam "ok, vamos bombardeá-los". As pombas diziam
"peraí, vamos ver primeiro se os rumores são
verdadeiros; se os rumores forem verdadeiros, então podemos
bombardeá-los, porque eles são uma ameaça aos
EUA". Que interessante! De repente eles estavam recebendo MIGs.
Bem, eles bem que tentaram comprar jatos em países europeus,
mas os EUA pressionaram os seus aliados de forma que eles não
enviassem à Nicarágua meios de proteção,
porque queriam que eles acabassem indo ter com os russos. Isso era
bom para propósitos propagandísticos. Então
eles se tornaram uma ameaça aos EUA. Lembrem-se, eles estavam
a apenas dois dias de marcha de Harlingen, no Texas. Nós
até mesmo declaramos estado de emergência nacional
em 1985 para proteger o país contra a ameaça da Nicarágua.
Por que eles iriam querer jatos? Bem, pelas razões que já
mencionei. Os EUA tinham total controle sob o espaço aéreo
deles, estavam sobrevoando-o e usando-o para fornecer instruções
à milica terrorista de forma a permitir que eles atacassem
"soft targets" sem que precisassem ter de enfrentar as
forças armadas do país. Todos sabiam que essa era
a razão. Eles não vão usar os seus jatos para
nada além disso. Mas a idéia de que a Nicarágua
pudesse defender seu espaço aé;reo contra ataques
super-poderosos que estavam direcionando forças terroristas
para atacar alvos civis indefensáveis, isso foi considerado
nos EUA como ultrajante, e de maneira bastante uniforme. As exceções
são tão poucas que eu poderia listá-las. Eu
não quero sugerir que vocês acreditem piamente em mim.
Dêem uma olhada. Isso inclue nossos próprios políticos,
incidentalmente.
Outro exemplo de como consideramos
o terroriamo está acontecendo nesse exato minuto. Os EUA
acabaram de designar um embaixador para a ONU que liderará
a guerra contra o terrorismo. Quem é ele? Bem, seu nome é
John Negroponte. Ele foi o embaixador americano no estado feudal,
que é exatamente isso, de Honduras no início dos anos
80. Houve certa confusão acerca do fato de que ele devia
estar sabendo, e certamente esse era o caso, da matança em
larga escala e outras atrocidades que estavam sendo feitas pelas
forças de segurança em Honduras, forças estas
que estavamos apoiando. Mas isso é apenas um detalhe. Como
pro-cônsul de Honduras, como ele era chamado lá, ele
eta o supervisor local da guerra terrorista baseada em Honduras,
algo pelo qual o seu país tinha sido condenado pela Corte
Mundial e também pelo Conselho de Segurança. E ele
acabou de ser designado como embaixador da ONU para liderar uma
guerra contra o terrorismo. Um outro experimento que vocês
podem fazer é checar para ver qual foi a reação
a respeito disso. Bom, eu direi o que vocês vão achar,
mas procurem assim mesmo. Isso nos diz um bocado acerca da guerra
contra o terrorismo e um bocado acerca de nós mesmos.
Depois que os EUA tomaram
o país novamente sob as condições que foram
tão bem ilustradas na imprensa, o país ficou bastante
destruído nos anos 80, mas tem ido à bancarrota desde
então em todos os aspectos. Economicamente ele tem decaído
significativamente desde que os EUA o dominou, democraticamente
e em todos os demais aspectos. É agora o segundo país
mais pobre no hemisfério. Devo dizer... Não vou falar
a respeito disso, mas eu mencionei que eu falei sobre a Nicarágua
porque esse é um caso incontroverso. Se vocês olharem
para os outros países naquela região, o terrorismo
foi ali muito mais extremo e ele está diretamente relacionado
a Washington e isso não é de maneira nenhuma tudo.
Mas isso estava acontecendo
em outras partes do mundo também; considere a África.
Durante os anos Reagan, os ataques sul-africanos contra os países
vizinhos, que foram financiados pelos EUA e a Grã-Bretanha,
mataram cerca de um milhão e meio de pessoas e deixaram um
prejuízo de 60 bilhões de dólares e países
completamente destruídos. E se formos ao redor do mundo,
encontraremos mais exemplos.
Agora essa foi a primeira
guerra contra o terrorismo sobre a qual acabei de dar alguns pequenos
exemplos. É de se esperar que prestemos atenção
a eles? Ou talvez achar que eles possam ser relevantes? Afinal eles
não são exemplos da história antiga. Bem, evidentimente
não o são se vocês levarem em consideração
os tópicos correntes da discussão sobre a guerra contra
o terrorismo que tem sido o principal foco de atenção
nos últimos dias.
Eu mencionei que a Nicarágua
se tornou o segundo país mais pobre do hemisfero. Qual é
o mais pobre deles? Bem, é claro que é o Haiti, que
também foi vítima da maior parte das intervenções
americanas no século XX. Deixamos aquele lugar totalmente
destruído. É o país mais pobre. A Nicarágua
é o segundo na escala das intervenções dos
EUA durante o séc. XX. É o segundo mais pobre. Na
verdade, essa posição está sendo disputada
com a Guatemala. Muda a cada ano ou dois. Também existe uma
disputa acerca de que país foi a pior vítima das intervenções
norte-americanas. Acho que esperam que pensemos que tudo isso foi
algum tipo de acidente. Que taisfatos nada tem a ver com o que ocorreu
na história. Talvez.
O país que mais violou
os direitos humanos na décade de 90 foi a Colómbia,
sem sombra de dúvida. Esse país foi também
o que mais recebeu apoio militar dos EUA durante esse período,
mantendo desse modo o terrorismo e a violação dos
direitos humanos. Em 1999, a Colómbia foi substituída
pela Turquia na escala de maior destinatário de armas americanas
no mundo inteiro, isso excluindo Israel e Egito, que estão
numa categoria separada. E isso nos diz bastante acerca da guerra
contra o terrorismo.
Por que a Turquia estava
recebendo tamanha quantidade de armas norte-americanas? Bem, se
vocês observarem o fluxo de armas dos EUA na Turquia, vão
notar que a Turquia sempre recebeu armas norte-americanas. É
um lugar estratégico, membro da OTAN, etc. Mas o fluxo de
armas para a Turquia cresceu significamente em 1984. Não
teve nada a ver com a guerra fria. Os russos estavam sendo derrotados.
Tal fluxo manteve-se alto entre 1984 a 1999. Quando ele diminuiu,
foi substituído pela Colómbia. O que aconteceu entre
1984 e 1999? Bem, em 1984 a Turquia iniciou uma guerra terrorista
contra os curdos no sudeste da Turquia. E esse foi exatamente o
momento em que a ajuda dos EUA alcançaram o topo, ajuda militar.
E não foram apenas pistolas. Foram jatos, tanques, treino
militar, etc. Tal ajuda manteve-se alta à medida que as atrocidades
também cresciam no decorrer dos anos 90. O ano em que o maior
apoio se deu foi 1997. Em 1997, a ajuda militar dos EUA à
Turquia foi maior do que no período de 1950 e 1983, ou seja,
durante a guerra fria, o que é uma indicação
do quanto a guerra fria influenciou as medidas. E os resultados
foram impressionantes. Isso acarretou num total de 2-3 milhões
de refugiados. Uma das piores limpezas étnicas do final da
década de 90. Dezenas de milhares de pessoas mortas, 3500
vilas e cidades destruídas, muito mais do que em Kosovo.
E os EUA eram responsáveis pela manutenção
de 80% das armas, aumentando esse número na proporção
do aumento das atrocidades, que alcançou o seu cume em 1997.
O apoio começou a declinar em 1999 porque, uma vez mais,
o terrorismo funciona geralmente assim quando é liderado
por seus agentes principais, majoritariamente os poderosos. Desse
modo, em 1999, a terror turco, chamado obviamente anti-terror -
mas, como eu já disse, isso é universal -, funcionou.
Então a Turquia foi substituída pela Colómbia,
que ainda não tivera sucesso em sua guerra terrorista. E
desse modo tiveram de alcançar a primeira posição
na escala de recipientes de armas norte-americanas.
Bem, o que faz tudo isso
particularmente impressionante é que esses acontecimentos
estavam tomando lugar bem no meio de uma grande avalanche de auto-congratulação
por parte dos intelectuais ocidentais que provavelmente não
tem par na história. Quero dizer, vocês todos devem
lembrar disso. Foi apenas há alguns anos atrás. Grande
auto-adulação sobre como pela primeira vez na história
nós fomos tão magnificentes; que nós estamos
nos posicionando a favor de princípios e valores; dedicados
à anulação da falta de humanidade em toda a
parte do mundo na nova era disso-e-daquilo, e assim por diante.
E nós certamente não podemos tolerar atrocidades nos
países fronteiriços da OTAN. Esse tipo de coisa foi
repetido várias vezes. Apenas dentro das fronteiras da OTAN
é que podemos não somente tolerar atrocidades bem
piores, mas também contribuir com elas. Outra investigação
acerca da civilização ocidental e nossa própria
é quão freqüentemente tal assunto tem sido levado
em consideração? Tentem investigar. Não vou
repetir. Mas é instrutivo. É um ato bastante impressionante
para um sistema de propaganda numa sociedade livre. É bastante
interessante. Eu não acredito que se pudesse fazer isso num
estado totalitário.
E a Turquia está bastante
grata. Apenas há alguns dias atrás, o primeiro ministro
Ecevit anunciou que a Turquia se uniria à guerra contra o
terrorismo, bastante entusiasticamente, bem mais que outros países.
Na verdade, ele disse que seu país contribuiria com tropas,
coisa que nenhum outro país estaria ansioso por fazer. E
ele explicou porquê. Ele disse: nós devemos gratidão
aos EUA porque foram os EUA o único país que contribuiu
tão significativamente para nossa, em suas palavras, "guerra
contra o terrorismo", isto é, para a nossa própria
limpreza étnica massiva e atrocidades e terrorismo. Outros
países ajudaram um pouco, mas ficaram na retaguarda. Os EUA,
no entanto, contribuíram entusiastica e decisivamente e conseguiram
fazer isso por conta do silêncio - pode ser a palavra certa
- das classes educadas da população que poderiam facilmente
saber os detalhes desse caso. É um país livre, no
final das contas. Você pode ler relatos de direitos humanos.
Você pode ler todo tipo de coisa. Mas escolhemos contribuir
com as atrocidades e a Turquia está bastante feliz, eles
nos devem por isso e desse modo contrbuirão com tropas exatamente
como o fizeram na guerra da Sérvia. A Turquia foi bastante
elogiada por usar os F-16 que demos a eles para bombardear a Sérvia,
exatamente como tinham feito com sua própria população
até o momento em que foram bem-sucedidos em eliminar o terrorismo
interno - como eles assim denominaram. E como é comum, como
sempre ocorre, resistência não inclui terrorismo. É
uma verdade na Revolução Americana. É uma verdade
em cada um dos casos que conheço. Assim como é verdade
que aqueles que possuem um monopólio de violência falam
sobre si próprios como se estivessem lutando contra o terrorismo.
Isso é de fato bastante
impressionante e tem a ver com a coalisão que está
sendo organzada para lutar na guerra contra o terrorismo. E é
bastante interessante ver como tal coalisão está sendo
descrita. Então dêem uma olhada no jornal Christian
Science Monitor dessa manhã. Esse é um bom jornal.
Um dos melhores jornais internacionais, com cobertura real do mundo.
A história principal, a que está na primeira página,
é sobre como os EUA, vocês sabem, as pessoas costumavam
não gostar dos EUA, mas agora estão começando
a respeitar esse país, e elas estão bastante felizes
com a maneira pela qual os EUA estão lidando com essa guerra
contra o terrorismo. E o principal exemplo, bem, na verdade o único
exemplo sério, os outros são apenas piadas, é
a Algéria. Acontece que a Algéria está bastante
entusiasmada com a guerra dos EUA contra o terrorismo. A pessoa
que escreveu o artigo é um expert sobre assuntos da África.
Ele deve saber que a Algéria é um dos estados mais
terroristas no mundo e tem promovido atentados terroristas terríveis
contra a sua própria população nos últimos
anos, na verdade. Por algum tempo, esses fatos eram encobertos.
Mas foram finalmente expostos em França por desertores do
exército da Algéria. Isso já se tornou público
lá e na Inglaterra. Aqui, no entanto, ainda estamos orgulhosos
porque um dos piores estados terroristas do mundo está agora
entusiasticamente cumprimentando os EUA por sua guerra contra o
terrorismo, e mesmo festejando o fato de ser os EUA o país
a liderar tal guerra. Isso mostra como estamos nos tornando popular.
E se vocês olharem
para a coalisão que está sendo formada contra o terrorismo,
isso vai revelar bastante mais coisas. Um dos membros principais
de tal coalisão é a Rússia, que está
contente por ter os EUA como aliados em sua própria guerra
terrorista assassina na Chechênia. A China também está
se unindo entusiasticamente. Lá também eles estão
contentes por terem o apoio nas atrocidades que estão cometendo
na região oeste do país contra os que são denominados
muçulmanos sectários. A Turquia, como já mencionei,
está bastante contente com a guerra contra o terror. Eles
são especialistas. A Algéria, a Indonésia,
estão todos contentes por ter ainda mais apoio dos EUA pelas
atrocidades que estão cometendo em Ache e em outros lugares.
Podemos considerar em detalhe cada membro da lista; a lista de estados
que se uniram na coalisão contra o terror é bastante
impressionante. Eles têm uma característica em comum.
Eles estão certamente entre os maiores estados terroristas
do mundo. E eles estão sendo liderados pelo campeão
de todos.
Bom, isso nos leva à
questão "o que é terrorismo?" Eu tenho considerado
que nós todos entendemos o conceito de terrorismo. Bem, o
que é terrorismo então? Bom, existem respostas fáceis
para essa questão. Há uma definição
oficial. Você pode encontrá-la no código dos
EUA ou em manuais militares dos EUA. Uma breve sentença tirada
de um manual militar dos EUA é bastante justa: terrorismo
é o uso calculado da violência ou a ameaça de
violência para se alcançar objetivos de ordem política
ou religiosa através do uso de intimidação,
coerção ou da perpetração do medo. Isso
é terrorismo. É uma definição bastante
justa. Eu considero razoável acitá-la. O problema
é que ela não pode ser aceitada, porque se você
o faz, conseqüências erradas podem resultar. Por exemplo,
todas as conseqüências que acabei de citar. Há
uma grande tentativa nesse instante na ONU de se tentar desenvolver
um tratado compreensivo sobre o terrorismo. Quando Kofi Annan recebeu
o prêmio Nobel há pouco tempo, vocês devem ter
percebido que foi dito que ele teria falado que devíamos
parar de perdermos mais tempo no tocante a isso e agirmos o quanto
antes.
Mas há um problema.
Se usarmos a definição oficial de terrorismo no tratado
compreensivo, teremos resultados completamente errados. Desse modo,
isso não pode ser feito. Na verdade, é ainda pior
que isso. Se vocês derem uma olhadinha na definição
de Guerrilha de Baixa Intensidade, que é a medida oficial
dos EUA, você verão que ela é uma paráfrase
bastante próxima do que acabei de ler. Na verdade, Guerrilha
de Baixa Intensidade é apenas um outro nome para terrorismo.
Essa é a razão pela qual todos os países, pelo
que sei, chamam qualquer ato terrível que estejam promulgando
"anti-terrorismo". Nós chamamos Anti-Insurreição,
ou Conflito de Baixa Intensidade. Então esse é um
problema sério. Você não pode usar as definições
atuais. É preciso cuidadosamente achar uma definição
que não acarrete em todas as possíveis conseqüências
erradas.
Há outros problemas.
Alguns deles vieram à tona em dezembro de 1987, no cume da
primeira guerra contra o terrorismo, isto é, quando o furor
contra a praga estava em seu apogeu. A Assembléia Geral da
ONU aprovou uma resolução bastante vigorosa contra
o terrorismo, condenando a praga nos termos mais vigorosos possíveis,
pedindo a todos os países para lutarem contra ela de todas
as formas possíveis. Tal resolução foi aprovada
unanimamente. Um país se absteve: Honduras. Por que os EUA
e Israel votariam contra uma resolução contra o terrorismo
em seus termos mais vigorosos, na verdade nos mesmos termos usados
na administração Reagan? Bem, há uma razão.
Há um parágrafo nessa longa resolução
que diz que nada nessa resolução infringe nos direitos
das pessoas lutando contra regimes racistas e colonialistas ou contra
ocupações militares estrangeiras que queiram continuar
com sua resistência com o apoio de outros, outros estados,
estados estrangeiros em favor de suas causas justas. Bem, os EUA
e Israel não podiam aceitar isso. A razão principal
pela qual não podiam aceitar isso naquela época era
a África do Sul. A Áfricado Sul era um aliado, oficialmente.
Havia uma força terrorista na África do Sul. Era chamada
o Congresso Africano Nacional. Ela era uma força terrorista
oficial. A África do Sul era um aliado e nós certamente
não podíamos dar apoio a ações de um
grupo terrorista contra um regime racista. Isso seria impossível.
E obviamente há outra
questão. Os territórios ocupados de Israel, indo já
para o seu 35 ano. Apoiados principalmente pelos EUA, que já
há 30 anos tentam se opor a um acordo diplomático
- e ainda o fazem. Há outro exemplo naquela mesma época.
Israel estavao cupando o sul do Líbano e estava enfrentando
o combate do que os EUA chamam uma força terrorista, Hizbullah,
que de fato foram bem sucedidos em tirar Israel do Líbano.
E não podemos permitir que ninguém lute contra uma
ocupação militar quando ela é uma das que damos
apoio, desse modo, os EUA e Israel tiveram de votar contra a resolução
da ONU contra o terrorismo. E eu já mencionei antes que um
voto dos EUA contra alguma coisa... significa necessariamente um
veto. O que é apenas metade da história. Os EUA também
vetam fatosda história. Assim, nada disso foi relatado, e
nenhum desses incidentes jamais apareceram nos anais sobre o terrorismo.
Se vocês derem uma olhada nos trabalhos acadêmicos sobre
o terrorismo, observarão que nada do que acabei de dizer
aparece aí. A razão para isso é que as pessoas
erradasestão segurando as armas. Precisamos levar mais a
sério as definições e os trabalhos acadêmicos
de forma a chegarmos a conclusões mais acertadas; de outro
modo, não teremos pesquisar nem jornalismo honoráveis.
Bem, esses são alguns problemas que estão impedindo
o esforço de se desenvolver um tratado compreensivo contra
o terrorismo. Talvez devessemos ter uma conferência acadêmica
ou algo assim para tentarmos ver a possibilidade de se propor um
caminho de definirmos o terrorismo de forma que os resultados sejam
corretos, e não errados. Isso não será fácil.
Bom, vamos agora voltar à
quarta questão: "quais são as origens dos crimes
de 11 de setembro?" Aqui precisamos fazer uma distinção
entre duas categorias que não devem ser consideradas em conjunto.
Uma delas é no que respeita aos verdadeiros agentes do crime,
a outra tem a ver com um tipo de reseva de ao menos simpatia, e
algumas vezes apoio que eles recebem até mesmo entre as pessoas
que se opoem aos criminosos e seus atos. E essas duas coisas são
coisas bastante diferentes.
Bem, no que diz respeito
aos responsáveis, de certo modo ainda não estamos
muito certos. Os EUA não estão conseguindo - ou não
estão querendo - oferecer qualquer evidência, qualquer
evidência que faça sentido. Houve um tipo de jogo há
algumas semanas atrás quando Tony Blair foi instruído
a apresentar uma evidência. Eu não sei exatamente qual
foi o propósito disso. Talvez para fazer parecer que os EUA
estavam guardando algum tipo de evidência secreta que não
podiam revelar ou para fazer com que Tony Blair pudesse justificar
atos Churchillianos, ou algo assim. Qualquer que tenham sido as
intenções das relações públicas,
ele ofereceu uma documentação que foi considerada
em círculos sérios tão absurda que ela chegou
sequer a ser menconada. Desse modo, o Wall Street Journal, por exemplo,
um dos jornais mais sérios que temos, publicou um artigo
bastante pequeno, creio que na página 12, em que observam
que não existem muitas evidências e então citam
um alto oficial dos EUA dizendo que não importava se existissem
evidências ou não, pois eles o fariam o que tivessem
de fazer com ou sem elas. Então para que se importar com
evidências? As imprensas mais ideológicas, como o New
York Times e outros jornais, trouxeram manchetes enormes em primeira
página. Mas a reação do Wall Street Journal
foi razoável, e se vocês derem uma olhadinha na chamada
"evidência", vocês saberão porquê.
Mas consideremos que seja verdade. É realmente impressionante
para mim como foram fracas as evidências. Eu cheguei mesmo
a pensar que se podia fazer um melhor trabalho sem um serviço
de inteligência [platéia ri]. Na verdade, considerem
que elas apareceram depois de semanas da mais intensiva investigação
na história de todo serviço de inteligência
do mundo ocidental na tentativa de se juntar evidências. E
foi um caso prima-facie. Foi um caso fortíssimo, mesmo antes
de se ter algo em mãos. E acabou exatamente como tinha começado,
um caso prima-facie. Então consideremos que seja verdade.
Então consideremos que - pareceu óbvio desde o primeiro
dia, e ainda parece - os verdadeiros responsáveis são
originários do islamismo radical, aqui chamado, redes fundamentalistas
das quais a rede de bin Laden é sem dúvida parte significante.
Se eles estavam envolvidos ou não ninguém sabe. Isso
realmente não vem ao caso.
São essas redes que
estão por trás de tudo. Bem, de onde vieram elas?
Todos sabemos a resposta. Ninguém sabe melhor sobre isso
que a CIA, porque foi essa organização que as organizou
e as financiou por bastante tempo. Elas vieram à tona na
década de 80, apoiadas pela CIA e por seus aliados: o Paquistão,
a Grã-Bretanha, a França, a Arábia Saudita,
o Egito e a China estavam todos envolvidos. Eles podiam até
estar envolvidos um pouco antes, talvez por volta de 1978. A idéia
foi tentar atormentar os russos, o inimigo em comum. De acordo com
o Conselheiro de Segurança Nacional do presidente Carter,
Zbigniew Brzezinski, os EUA se envolveram nisso em meados de 1979.
Vocês se lembram, apenas para colocar as datas nos eixos,
que os russos invadiram o Afeganistão em dezembro de 1979?
Ok. De acordo com Zbigniew Brzezinski, o apoio dos EUA pela guerra
mojahedin contra o governo começou seis meses antes. Ele
é bastante orgulhoso desse fato. Ele diz que nós levamos
os Russos para, em suas próprias palavras, uma armadilha
afegã, ao apoiarmos o mojahedin, fazendo-os invadirem, fazendo-os
caírem na armadilha. De modo que pudéssemos então
desenvolver tar exército mercenário. Não um
pequeno exército, talvez 100.000 homens ou algo assim, juntando
os maiores assassinos que podiam achar, que eram islamistas radicais
fanáticos pelos aredores da África do Norte, Arábia
Saudita, onde quer que pudessem encontrá-los. Eles eram freqüentemente
chamados os "afeganos", mas muitos deles, como bin Laden,
não eram afegãos. Eles foram unidos pela CIA e seus
comparsas de vários lugares. Se Zbigniew Brzezinski está
dizendo a verdade ou não, não sei. Ele pode ter querido
somente se auto-engrandecer, ele é, aparentemente, bastante
orgulhoso dessa feita, sabendo incidentalmente quais seriam as conseqüências.
Mas talvez seja verdade. Saberemos um dia se os documentos forem
liberados. De qualquer maneira, essa é a percepção
dele. Por volta de janeiro de 1980, não era sequer questionado
o fato de estarem os EUA organizando os afeganos, essa força
militar massiva, para tentar fazer o maior estrago com os russos.
Foi algo legítimo para os afegãos lutar contra a invasão
russa. Mas a intervenção dos EUA não estavam
ajudando os afegãos. Na verdade, apenas ajudaram a destruir
o país, e muito mais. Os afeganos forçaram por fim
a derrota dos russos.
Ao mesmo tempo, as forças
terroristas que a CIA estava organizando, armando e treinando estavam
organizando seus próprios atos. Não era nenhum segredo.
Um dos primeiros atos foi em 1981 quando eles assassinaram o pesidente
do Egito, que foi um de seus criadores mais entusiasticos. Em 1983,
uma bomba humana suicida - que podia ou não estar relacionado,
é bastante nebuloso, inguém sabe - fez com que o exército
militar dos EUA desertassem o Líbano. E os atos continuaram.
Eles tinham seus próprios planos. Os EUA estavam felizes
em poder mobilizá-los a favor de suas causas, mas ao mesmo
tempo eles estavam organizando seus próprios planos. Eles
foram bem claros acerca disso. Depois de 1980, quando os russos
desistiram da invasão, eles simplesmente voltaram suas atenções
para outros alvos. Desde então, têm lutado na Chechênia,
no Oeste da China, na Bósnia, na Kashmira, no sudoeste da
Ásia, na África do Norte, em toda a parte.
Estão nós dizendo
apenas o que pensam. Os EUA querem silenciar o único canal
de TV livre no mundo Árabe porque eles estão televisionando
uma quantidade enorme de coisas, que vão dese Powell até
Osama bin Laden. Desse modo, os EUA estão agora se juntando
aos regimes repressivos do mundo árabe no sentido de calarem
os que falam. Mas se você derem ouvido ao que bin Laden diz,
verão que vale a pna. Há bastante entrevistas. E há
muitas entrevistas lideradas por reporteres do ocidente, se você
preferem não ouvir a voz dele, como as feitas por Robert
Fisk e outros. E o que ele vem dizendo é bastante consistente
por já há bastante tempo. Ele não é
o único, mas talvez o mais eloqüente. Não é
consistente apenas em relação ao tempo, mas sobretudo
em relação às ações. Então
há muitas razões para levá-lo a sério.
O principal inimigo deles é o que chamam os regimes autoritários,
brutais e opressivos do mundo árabe, e quando dizem isso,
a resonância é sentida em muitas partes da região.
Eles também querem defender substituí-los por governos
islámicos. Aí é que perdem apoio do povo da
região. Mas até então, as pessoas estão
a seu favor. Pelo ponto de vista deles, até da Arábia
Saudita - o estado fundamentalista mais extremo -, até o
Talibão não é islâmico o suficiente para
eles. Ok, naquele ponto, eles receberam muito pouco apoio, mas até
aquele ponto, ele receberam bastante apoio. Eles também queriam
defender os muçulmanos em outras regiões. Eles odeiam
os russos enormemente, mas assim que os russos abandonaram o Afeganistão,
eles pararam de cometer atos terroristas na Rússia, como
vinham fazendo antes disso, com o apoio da CIA. Eles mudaram-se
para a Chechênia. Mas ali estão, defendendo os muçulmanos
contra a invasão russa. A mesma coisa que ocorre em todos
os outros lugares que já mencionei. Do ponto de vista deles,
estão defendendo os muçulmanos contra os inféis.
E eles falam a respeito disso bastante claramente e isso é
exatamente o que vêm fazendo.
Mas por que agora voltaram-se
contra os EUA? Bom, isso tem a ver com o que chamam a invasão
dos EUA na Arábia Saudita. Em 1990, os EUA estabeleceram
bases militares permanentes na Arábia Saudita, o que, do
ponto de vista deles, era algo comparável à invasão
russa ao Afeganistão, sendo que a Arábia Saudita é
um lugar ainda mais importante. É a terra dos pontos mais
sagrados do mundo islâmico. E foi exatamente aí quando
as atividades deles se voltaram contra os EUA. Se vocês lembram,
em 1993 eles tentaram explodir o World Trade Center. Conseguiram
apenas um pouco, mas não tudo, e isso era apenas um exemplo
do que podia vir. Os planos eram explodir o prédio da ONU,
a Holanda, o túnel Lincoln, o prédio do FBI. Eu acho
que tinham outros alvos na lista. Bem, eles somente conseguiram
realizar parte dos projetos, não ele por inteiro. Uma dos
prisioneiros, finalmente, entre vários, era um clérigo
egípcio que tinha entrado nos EUA - apesar da oposição
do Serviço de Imigração - graças à
CIA, que queria ajudar um de seus amigos. Umas semanas depois, ele
estaria bombardeando o World Trade Center. E isso tem acontecido
sempre. Não vou entrar em detalhes, mas isso, se querem entender
melhor o quador, é algo consistente. É um quadro consistente.
E sobre a tal reserva de
apoio? Bem, não é tão difícil entender
o que isso seja. Uma das coisas boas que tem acontecido desde 11
de setembro é que alguns membros da imprensa e algumas discussões
têm começado a se abrir para algumas dessas coisas.
O melhor deles ao meu entender é o Wall Street Journal, que
imediatamente começou a publicar, em poucos dias, reportagens
sérias, buscando reportagens sérias sobre as razões
pelas quais as pessoas da região, apesar de odiarem bin Laden
e desprezarem o que quer que ele faça, apoiam-no de muitas
maneiras e até consideram-no a consciência do Islã,
como já se disse. Agora o Wall Street Journal e outros jornais
não estão fazendo pesquisas de opinião pública.
Eles estão pesquisando a opinião de seus amigos: banqueiros,
profissionais, advogados internacionais, homens de negócio
ligados aos EUA, pessoasque entrevistam em restaurantes McDonalds,
que são restauranteselegantes lá, vestindo roupas
americanas da hora. Essas são as pessoas que eles estão
entrevistando, porque querem entender quais são as atitudes
delas. E as atitudes delas são bem explícitas, bem
claras de muitas maneiras no que concerne à mensagem de bin
Laden e de outros. Eles estão bastante zangados com os EUA
por conta do apoio que dão a regimes autoritários
e brutais; a intervenção que fazem para impedir qualquer
tipo de movimentação a favor da democracia; a intervenção
que realizam para impedir o desenvolvimento economico; as medidas
que acabam por devastar sociedades civis do Iraque e fortalecer
Saddam Hussein; e eles lembram-se, mesmo que prefiramos não
fazê-lo, que os EUA e a Grã-Bretanha ajudaram Saddam
Hussein em suas piores atrocidades, o que inclui o ataque aos curdos;
bin Laden sempre menciona isso. E eles sabem disso mesmo que não
queiramos. E claro o apoio que dão à ocupação
militar israelita que é severa e brutal. Ela estáagora
completando 35 anos. Os EUA têm dado a maior parte doi apoio
econômico, militar e diplomático para essa ocupação,
e ainda o faz. E sabemos que eles não gostam disso. Particularmente
quando esse fato é emparelhado com as medidas dos EUA contra
o Iraque, contra as sociedades civis do Iraque, que estão
sendo destruídas. Ok, essas são, no geral, as razões.
E quando bin Laden dá essas razões, as pessoas a reconhecem
como válidas e o apoiam.
Agora essa não é
a forma como as pessoas aqui gostam de considerar o assunto, pelo
menos as pessoas com educação formal, com opiniões
liberais. Elas preferem a seguinte linha de raciocínio que
tem estado na imprensa, na maior parte de liberais esquerdistas,
incidentalmente. Eu não fiz até o momento nenhum estudo
sério, mas acredito que a opinião da direita têm
sido em geral mais honesta. Mas considerem o New York Times, por
exemplo, que publicou um artigo do Ronald Steel, um intelectual
liberal de esquerda. Ele se pergunta: "por que eles nos odeiam?".
Esse artigo apareceu no mesmo dia em que o Wall Street Journal publicou
a pesquisa de opinião que mostrava as razões pelas
quais eles nos odeiam. Então ele afirma "eles nos odeiam
porque somos os campeões do mundo no que concerne à
nova ordem do capitalismo, individualismo, e democracia, o que deveria
ser a norma em qualquer parte". Essa seria a razão pela
qual eles nos odeiam. No mesmo dia em que o Wall Street Journal
publica uma pesquisa com opiniões de banqueiros, profissionais,
advogados internacionais que dizem "olhem, nós odiamos
vocês porque vocês estão impedindo a democracia,
estão impedindo o desenvolvimento econômico, estão
dando apoio a regimes brutais e terroristas, e estão fazendo
tudo isso nessa região". Alguns dias depois, Anthony
Lewis explicou que os terroristas buscam apenas "niilismo apocalíptico",
nada mais; e nada do que façamos importa. A única
conseqüência de nossos atos, ele afirma, que poderia
ser perigosa é que ela dificulta para a unificação
dos árabes na coalização contra o terrorismo.
Mas além disso, o que quer que fazemos é irrelevante.
Bom, vocês devem saber,
pelo menos isso tem a vantagem de ser algo reconfortante. Isso nos
faz sentirmo-nos bem: como somos bons. Nos possibilita desconsiderarmos
as conseqüências de nossas ações. Tem alguns
defeitos. Um é que está em total discordância
com tudo o que sabemos. E outro defeito é que isso é
uma justificativa perfeita para fazê-lo crer na validade de
se iniciar um ciclo de violência. Se vocês querem, podem
viver com a cabeça enterrada na areia e fingir que eles nos
odeiam porque estão contra a globalização,
que essa é a razão pela qual mataram Sadat há
20 anos, e lutaram contra os russos, e tentaram bombardear o World
Trade Center em 1993. E essas pessoas estão todas no meio
de... globaliação corporativa... mas se preferem acreditar
nisso, é algo reconfortante. E isso é uma forma excelente
da fazer com que a violência cresça. Isso é
violência tribal. Você fez algo comigo, vou fazer algo
pior com você. Não me importo quais sejam as razões.
Apenas faremos assim. Essa é a maneira que se deve agir.
Opinião bem direta, liberal-esquerdista.
Quais são as opções
então? Bem, há inúmeras. Uma medida estreita
para o início de conversa seria seguir o conselho de radicalistas
bastante extremos, como o Papa [platéia ri]. O Vaticano disse
imediatamente "olhem, é um crime terrorista terrível".
No caso de um crime, você tenta encontrar os responsáveis,
os traz à corte, julgam-nos. Não mata cidadões
inocentes. Se alguém roubasse minha casa e eu pensasse que
o cidadão que fez isso mora provavelmente no bairro do outro
lado da rua, eu não pegaria uma arma e mataria todo mundo
naquele bairro. Esse não é o meio de lidarmos com
um crime, quer ele seja pequeno, como o que acabei de citar, ou
realmente massivo, como a guerra terrorista dos EUA contra a Nicarágua,
mesmo crimes piories, ou outros intermediários. E há
vários precedentes para isso. Na verdade, eu já citei
um precedente, a Nicarágua, um estado que abriga a lei. Essa
foi provavelmente a razão pela qual a bombardeamos: eles
seguiram os princípios corretos. Agora, é claro, não
chegaram a lugar nenhum, porque estavam indo contra um poder que
não permitiria que procedimentos legais fossem seguidos.
Mas se os EUA tentassem atacá-los, ninguém os impediria.
Na verdade, todos os aplaudiriam. E há muitos outros precedentes.
Quando o IRA bombardeia Londres,
o que é algo extremamente sério, a Grã-Bretanha
poderia, apesar de ser algo impraticável - vamos desconsiderar
isso... Uma possível resposta seria bombardear Boston, que
nada mais é que a fonte da maior parte do financiamento para
tais ataques. E, claro, tirar do mapa o oeste de Belfast. Bom, vocês
sabem, apesar da impraticabilidade, isso seria idiotia criminosa.
A forma de lidar com isso foi o que de fato fizeram. Isto é,
achar os responsáveis; trazê-los para julgamento; e
considerar as razões. Porque tais atos não vêm
do nada. Eles são gerados por algo em particular. Quer sejam
um crime nas ruas ou um crime terrorista mostruoso ou qualquer outro.
Há razões. E geralmente se se consideram as razões,
algumas delas são legítimas e merecem ser estudadas,
independentemente do crime, elas precisam ser consideradas porque
são legítimas. E esse é o modo de lidar com
tais coisas. Há muitos exemplos que tais.
Mas há problemas com
essa atitude. Um problema é que os EUA não reconhecem
a jurisdição de instituições internacionais.
De forma que não podem recorrer a elas. Os EUA rejeitaram
a jurisdição da Corte Mundial. E também recusaram
ratificar a Corte Criminal Internacional. São poderosos o
suficiente para organizarem uma nova corte se assim o quiserem,
de forma a não serem impedidos de nada. Mas há um
problema com qualquer tipo de corte: você precisa de evidências.
Se você for para qualquer tipo de corte, você precisa
de algum tipo de evidência, e não de um Tony Blair
falando na televisão. E isso é algo difícil,
quando não impossível de se achar.
Sabem, pode ser que as pessoas
que foram responsáveis pelos crimes de 11 de setembro se
suicidaram. Ninguém saberia disso melhor que a CIA. Essas
redes são descentralizadas, sem hierarquias. Eles seguem
um princípio que é chamado Resistência Sem Líder.
Esse é um princípio que vem sendo adotado por terroristas
cristões da direita nos EUA. É chamado Resistência
Sem Líder. Você tem grupos pequenos que fazem coisas.
Eles não falam com ninguém. Há um tipo de razão
geral para o que fazem, então fazem. Na verdade, as pessoas
que estão engajadas em movimentos pacifistas conhecem bem
tais grupos. Costumamos chamá-los de grupos de afinidades.
Se vocês considerarem que qualquer grupo em que você
esteja afiliado está sendo monitorado pelo FBI, quando algo
sério está acontecendo, não se faz uma reunião.
Você vai fazer com pessoas que você conhece e confia,
um grupo de afinidades; desse modo suas ações não
serão conhecidas. Essa é uma das razões pelas
quais o FBI nunca conseguiu compreender o que está acontecendo
em movimentos populares. E outras agências de inteligência
funcionam de igual modo. Eles não conseguem. Isso é
Resistência Sem Líder, ou grupos de afinidades, e em
redes descentralizadas é muito difíceis de se penetrar.
E é bem possível que eles simplesmente não
saibam. Quando Osama bin Laden diz que não está envolvido,
isso é inteiramente possível. Na verdade, é
bem difícil de imaginar como um cara numa caverna no Afeganistão,
que não tem sequer um radio ou um telefone, poderia ter planejado
uma operação tão sofisticada quanto essa. As
chances são que isso é apenas parte do que está
por trás de tudo. Vocês sabem, como outros grupos terroristas
de Resistência Sem Líder. O que significa que vai ser
muito difícil achar evidências.
E os EUA não querem
apresentar evidências porque querem poder agir sem precisar
disso. Essa é uma parte crucial da reação.
Você devem ter observado que os EUA sequer pediram autorização
ao Conselho de segurança, o que eles provavelmente teriam
dessa vez, não por razões honestas, mas porque os
outros membros permanentes do Conselho de Segurança são
também estados terroristas. Eles estão felizes em
puder juntar-se a uma coalisão contra o que chamam de terrorismo,
nomeadamente em favor do próprio terrorismo que praticam.
Como a Rússia, que não ia vetar: eles adoram a coalisão.
Desse modo, os EUA poderiam muito provavelmente receber autorização
do Conselho de Segurança, mas não o quiseram. E não
o quiseram porque seguem um princípio de longas datas, que
não é característica de George Bush, foi algo
explícito na administração de Clinton, articulada,
e vai muito além, e esse princípio resume-se ao fato
de que temos o direito de agir uniliteralmente. Não queremos
autorização internacional porque agimos uniliteralmente
a desse modo não a queremos. Não damos a mínima
para evidências. Não damos a mínima para negociações.
Nos lixamos para tratados. Nós somos o cara mais forte do
pedaço. Fazemos o que queremos. Autorização
é uma coisa má, e devemos evitá-la. Existe
até um nome para isso na literatura técnica. É
chamado estabelecer credibilidades. Você precisa estabelecer
credibilidade. Esse é um fator bastante importante em muitas
medidas. Foi a razão oficial dada para a guerra nos Balcãs,
e a razão mais plausível.
Se quiserem saber o que siginifica
credibilidade, pergunte ao seu favorito Don da máfia. Ele
vai te explicar direitinho o que quer dizer credibilidade. E é
a mesma coisa em casos internacionais, sendo que na universidade
ela é discutida sob outros nomes maiores, e esse tipo de
coisa. Mas o princípio é basicamente o mesmo. E faz
sentido. E geralmente funciona. O principal historicista que tem
escrito acerca disso nos últimos anos é Charles Tilly,
em um livro chamado "Coercion, Capital, and European States".
Ele observa que a violência tem sido o princípio central
da Europa por centenas de anos e a razão é simples:
ela funciona. Vocês sabem, é bastante razoável.
Ela quase sempre funciona. Quando você tem uma predominância
absoluta de violência e uma cultura de violência atrás
dela. Desse modo, faz mesmo sentido segui-la. Bem, isso tudo constitui
um problema na tentativa de se trilhar um caminho legal. E se vocês
tentarem segui-los, vão realmente abrir portas bastante perigosas.
Como os EUA ordenando que o Talibã entregue Osama bin Laden.
E eles lá estão respondendo de uma forma que é
considerada totalmente absurda e fora da realidade no ocidente,
isto é, eles estão dizendo ok, mas primeiro nos dê
alguma evidência. No ocidente, isso é considerado algo
impraticável. É um sinal de criminalidade. Como é
que eles podem estar pedindo evidência? Eu quero dizer, se
alguém nos pede para entregar alguém, nós o
fazemos no dia seguinte. Não pediríamos evidências.
[platéia ri].
Na verdade, é muito
fácil provar isso. Não precisamos inventar casos.
Por exemplo, nos últimos anos o Haiti tem pedido aos EUA
para extraditar Emmanuel Constant. Ele é um assassino em
grandes proporções. Ele é uma das figuras mais
importantes no extermínio de talvez 4000 ou 5000 pessoas
nos meados da década de 90, sob a junta militar, que incidentalmente
estava sendo, não de maneira tácita, apoiada pelas
administrações de Bush e de Clinton. Bem, ele é
um criminoso e tanto. Eles têm bastante evidências.
Não há nenhum problema quanto a isso. Ele já
havia sido julgado e sentenciado no Haiti e eles estão pedindo
aos EUA para emtregarem-no. Bem, quero dizer, façam pesquisas.
Vejam quanta discussão houve no tocante a isso. Na verdade,
o Haiti renovou o pedido há algumas semanas atrás.
Isso não foi sequer mencionado. Por que deveríamos
entregar um assassino convicto que foi responsabilizado por grande
parte do assassínio de 4000 ou 5000 pessoas há alguns
anos atrás? Na verdade, se de fato o entregarmos, quem sabe
o que ele teria para dizer? Talvez ele diga que foi financiado e
ajudado pela CIA, o que é provavelmente verdade. Não
queremos abrir essa porta. E ele não é o único.
Quero dizer, nos últimos
15 anos, Costa Rica tem tentado fazer com que os EUA entreguem um
tal John Hull, um latifundiário de Costa Rica que possui
propriedades nos EUA, a quem acusam de crimes terroristas. Ele esteve
usando suas terras - dezem eles, com boas evidências - como
base para a guerra dos EUA contra a Nicarágua, que não
é uma conclusão controversa, lembrem-se. Há
a Corte Mundial e o Conselho de Segurança por trás
disso. Então eles têm tentado fazer com que os EUA
o entreguem. Que tal? Não.
Eles na verdade confiscaram
a terra de um outro latifundiário norte-americano, John