É
necessário que os militantes, os revolucionários das
organizações de trabalhadores, que sofreram a cruel
experiência da derrota militar e a humilhação
como refugiados, dediquem uma séria e concentrada atenção
às lições da guerra e da revolução
espanhola, pela qual pagaram tão caro com o seu sangue e o
sangue de seus melhores camaradas.
Quebrando o silêncio
que nos foi imposto pela tirania dos estalinistas e outros contra-revolucionários,
continuaremos falando com a clareza que sempre utilizamos no órgão
de nosso grupo "O Amigo do Povo" . Nosso grupo, que escolheu
como símbolo Durruti, tem ocupado um lugar importante na revolução
espanhola. Assim foi, nos dias sangrentos de maio de 1937, quando
empunhamos a bandeira da revolta e combatemos os contra-revolucionários
(o P.C., o governo republicano, etc) assim como o reformismo dos dirigentes
da CNT-FAI.
Nós havíamos
previsto que a linha traçada depois de julho de 1936, dissociando
a guerra da revolução, conduziria inevitavelmente ao
desastre. Nossas teses foram confirmadas pelos fatos. A revolução
foi perdida em maio de 1937, E COM ELA A GUERRA. Gradualmente, as
zonas de importância econômica foram perdidas, culminando
com a queda de Aragón, uma grande derrota no Levante, terminando
na debandada da Catalunha, na rendição incondicional
de Madrid e do que ainda restava.
As causas da derrota foram
evidentes. Quando o espírito revolucionário das milícias
foi sepultado - em conseqüência de sua militarização,
após terem sido subordinadas a um exército desprovido
de entusiasmo e dinamismo – forjou-se o primeiro elo da cadeia
que nos levaria à derrota.
Os múltiplos ataques
e desfigurações das tarefas revolucionárias,
ocorridos já em julho de 1936, foram as sementes da trágica
colheita que nos levaria ao exílio sangrento, um exílio
que não pode ser entendido a não ser que compreendamos
os primeiros movimentos de traição e incapacidade, os
golpes pelas costas e a imoralidade que se estabeleceu.
DUAS
CHANCES PERDIDAS
Durante a revolução
espanhola, houve dois momentos decisivos: julho de 1936 e maio de
1937. Nessas duas ocasiões, o mesmo erro foi cometido. Os líderes
da CNT-FAI não impuseram o poder de nossas organizações,
que eram apoiadas pelas massas nas ruas, fábricas, campos e
outros locais de trabalho. Esses líderes foram, portanto, os
maiores responsáveis pelo desastre que aconteceu - a perda
da revolução, a derrota militar na guerra e o sangrento
exílio na França. Eles temiam a intervenção
estrangeira. Não assumiram a direção econômica
e política do país para não suscitar a hostilidade
dos "ditadores".
Mas, recusando-se a liderar
a revolução, nem por isso a abandonaram: eles começaram
a derrotá-la. Seu medo foi responsável pela contra-revolução,
pelo fato de os estalinistas terem tomado a terra dos camponeses e
trabalhadores. Esse foi o maior fator na quebra da unidade revolucionária
das massas.
Além de não
impor uma ditadura sobre os partidos antiproletários, os dirigentes
da CNT-FAI se tornaram assistentes dos liberais burgueses, da pequena
burguesia e do capitalismo internacional, os quais, sob a máscara
da democracia, serviram ao fascismo. Portanto, os dirigentes da CNT-FAI
derrotaram a revolução espanhola.
O final da guerra foi catastrófico.
Tudo foi perdido, nada foi ganho. Muito poderia ter sido salvo e usado
para evitar a terrível derrota. Negrin e seus lacaios haviam
depositado todo o dinheiro e ouro em bancos estrangeiros. Eles também
fizeram sua parte no massacre do proletariado espanhol.
O exército dos trabalhadores
não sabia por que lutava. Mas, na frente de batalha, os soldados
não estavam dispostos a lutar. Eles sabiam que, enquanto estavam
sendo massacrados no Ebro, na retaguarda, os burocratas se divertiam
à larga com mulheres bonitas e afundavam a República
na corrupção.
As pessoas trabalhavam
e morriam de fome. Na fila do pão, as mulheres e a população
em geral estavam cheias de ódio de Negrin e seu grupo de aduladores.
Os trabalhadores e suas famílias não tinham pão,
mas nos lares e residências do governo e dos chefes do PC comia-se
pão branco. O mundo inteiro nem sequer imaginava como era alto
o nível moral da população de Barcelona. Foram
os proletários de Barcelona que sofreram os bombardeios aéreos.
Não havia refúgio para eles. Mas os altos funcionários
e burocratas estavam sempre bem protegidos e seus familiares permaneciam
escondidos em lugares distantes.
O
POVO RESPONSÁVEL
O governo, além
de não representar os trabalhadores, defendia interesses decididamente
opostos aos deles. Aqueles que deveriam ter ouvido as reivindicações
do proletariado e que foram por ele convocados para defender seus
interesses de classe, ou seja: os líderes da CNT-FAI foram
os primeiros a traí-lo. Isso nós temos afirmado claramente
e sem subterfúgios. E continuaremos sempre a repetir nossas
acusações.
"Os Amigos de Durruti"
foram chamados de fascistas e provocadores. Duas vezes tentaram expulsar-nos
da CNT-FAI. Mas os proletários rejeitaram essa ordem de exclusão,
que veio da ala reformista.
Deixamos a Espanha com
nossas cabeças erguidas. Fomos a países estrangeiros
sem um centavo. Sofremos fome e frio nos campos de concentração.
Contudo, vários dos reformistas que exigiram nossa expulsão
passam muito bem. Não falamos apenas de Negrin e seus assassinos
stalinistas, que nos perseguiram e nos aprisionaram. Essas pessoas
possuem enormes somas em dinheiro, mas um dia terão de pagar
por sua traição.
Os acontecimentos nos deram
razão. Os mesmos problemas que nós publicamos em nossos
jornais clandestinos podem ser apresentados hoje ou mesmo amanhã.
Nós não estamos batidos. Apesar da tragédia,
não nos desviamos de nossos princípios e mantemos nossas
críticas. O reformismo da CNT-FAI levou-nos à derrota.
A liderança anarquista
foi parte influente na rendição incondicional de Madrid
a Franco. Os estalinistas, com seus protestos contra a rendição
de Madrid, tentaram posar como revolucionários. Mas não
iludiram os proletários, que já os odiavam muito antes
da iniciativa de Casado. Esse ódio existe desde o começo
da revolução, particularmente nas jornadas de maio de
1937.
A lição foi
dura. A imensa importância e o poder da revolução
espanhola podem ser avaliados pelos problemas que acarretou para os
negócios dos países europeus.
Se a revolução
espanhola tivesse sido bem sucedida, o fascismo teria sido derrotado,
com a importante conseqüência do início de uma ofensiva
proletária internacional. Não há dúvida,
o proletariado e o capitalismo têm mostrado estar permanentemente
envolvidos numa luta de vida ou morte. O capitalismo tem triunfado,
mas nós sabemos os motivos.
A democracia derrotou o
povo espanhol, não o fascismo. Franco jamais teria vencido
sem o PCE e Negrin. Mas o proletariado internacional também
é responsável. Ou melhor, seus líderes, que se
tornaram escudos para os capitalistas. Mas se nós tivéssemos
sido claros e diretos, em vez de falar jargões e usar uma linguagem
confusa, talvez tivéssemos alcançado os trabalhadores
do mundo todo.
AS
LIÇÕES
Da catástrofe, cabe-nos
extrair lições valiosas. Como anarquistas, devemos corrigir
uma série de pontos táticos e posições
que impedem o sucesso da ação revolucionária.
A revolução necessita da força e de saber usá-la
contra seus inimigos. Quando se possui a força revolucionária
do proletariado, é necessário saber como usá-la
e como preservá-la.
Nós somos inimigos
da colaboração com os capitalistas e a classe média.
A administração dos trabalhadores exige o poder dos
trabalhadores. A revolução requer a absoluta dominação
das organizações dos trabalhadores, como foi o caso
de julho de 1936, quando a CNT-FAI comandava. Há muitos aspectos
da situação e seria necessário estudá-los
em detalhe. Mas não devemos esquecer que o movimento dos trabalhadores
deve ser reconstruído sobre uma nova base, com uma nova moral,
após ter banido os líderes responsáveis pelo
desastre.
Nós afirmamos que
é necessário formar uma Aliança Revolucionária;
uma Frente de Trabalhadores, na qual ninguém seja autorizado
a entrar exceto numa base revolucionária, e fosse totalmente
proibido o ingresso de reformistas, do partido comunista, de democratas
republicanos e também daqueles militantes que, no caso espanhol,
contribuíram para o desastre.
Desde o início dessa
emigração, que começou após 30 meses de
luta, os "Amigos de Durruti" mantém a defesa dos
interesses do proletariado com a mesma energia e honestidade que empregaram
durante o curso da revolução espanhola.
Grupo
franco-espanhol AMIGOS DE DURRUTI, junho/julho de 1939 .