Áurea Quadrado: Uma "Mulher Livre"

 

Quando a sincera tenacidade e solidariedade parecem escassear, recordar a vida de Áurea Quadrado, militante do agrupamento anarquista Mujeres Libres, mostra que as coisas nunca foram fáceis.

Áurea nasceu com o século e, muito jovem, emigrou para Barcelona, onde começou a trabalhar no ramo têxtil. Com 16 anos foi militar no Sindicato Têxtil da CNT, distinguindo-se como uma dirigente muito ativa. Em 1918 era encarregada da comunicação com os presos anarquistas. Em 1925, quando o general Martinez Anido "inventou" a "lei de fugas" e contratou pistoleiros para assassinar dirigentes operários, Áurea, grávida, teve que atravessar sem passaporte a fronteira francesa.

Em 1936, ao estourar a Guerra Civil, os trabalhadores tomam o orfanato La Maternidad, até então dirigido por freiras, e fazem diretora Áurea Quadrado, que transformou radicalmente o funcionamento do Centro, apesar do aumento de crianças acolhidas por causa da guerra. La Maternidad, agora chamado Luise Michel era, segundo Emma Goldman, o mais perfeito orfanato que havia visto na Europa.

Terminada a guerra, Áurea como tantos milhões de espanhóis teve que fugir, mas o fez dirigindo a evacuação até Perpignan, dos meninos das guardas infantis da Solidariedade Internacional Antifascista (SIA). Durante quatro longos dias, teve que atravessar os Pireneus, várias vezes e sob condições terríveis. Como recordava Domingo Rojas: "Ao sair de Figueiras com três caminhões carregados de meninos, os aviões começaram a metralhar nossos caminhões. Todos corremos e nos atiramos ao solo; só a companheira Aurea tratou de tranqüilizar os meninos, dizendo-lhes: Não se assustem, não acontecer nada, se abaixem e cada um se encolha debaixo de um tronco. Todos ficamos envergonhados da valentia e integridade que teve sempre Áurea!"

Terminada a evacuação, dedicou sua atividade a ajudar os refugiados, mas sobretudo as crianças. Detida e torturada pela polícia francesa, que buscava o paradeiro de Domingo Rojas, com quem compartilhava a residência, é enviada ao Campo de Concentração de Argeles-sur-Mer.

Da França, embarcou com sua filha e outros refugiados até a República Dominicana, onde viveram em lamentável pobreza. Dali, com a ajuda de outros exilados, conseguiu ir para Cuba, onde puderam se recompor. Em 1943, depois de um breve período em que trabalhou como modista em Havana, foi para Nova York trabalhar na dublagem de filmes espanhóis. Pouco tempo depois foi para o México onde colaborou com grupos e publicações anarquistas, como Tierra y Libertad. Em 1953, mesmo os anos do México sendo mais sossegados, Áurea adoeceu e, por fim, perdeu a memória. Seus familiares a trouxeram à Espanha para passar seus últimos dias. Morreu em 1969, sem haver recobrado a memória.

M. Genofonte (Pontevedra)

Libera edição 82, Março de 1998