Preocupação Profunda

Tradução do Manoel

Nesse momento soturno, nós não podemos fazer nada para deter a invasão em curso. Mas isso não significa que a tarefa terminou para as pessoas que estão preocupadas com a justiça, a liberdade e os direitos humanos. Muito longe disso.

As tarefas serão muito mais urgentes do que antes, qualquer que seja o resultado do ataque. Sobre o qual ninguém tem a menor idéia : nem o Pentágono, a CIA ou seja lá quem for. As possibilidades vão das horripilantes catástrofes humanitárias as quais as agências de auxílio que atuam no Iraque têm prevenido, até resultados relativamente benignos - embora mesmo que nenhum fio de cabelo seja danificado na cabeça de ninguém , isso de forma alguma irá atenuar a criminalidade daqueles dispostos a submeter pessoas desprotegidas à riscos tão terríveis, na busca de seus propósitos vergonhosos. Quanto aos resultados, levará muito tempo até que julgamentos preliminares possam ser feitos . Uma tarefa imediata é emprestarmos o peso que pudermos para obter resultados mais benignos. Isso significa, primeiramente cuidar das necessidades das vítimas, não somente dessa guerra mas do feroz e destrutivo regime de sanções de Washington dos últimos dez anos, que devastou a sociedade civil, e fortaleceu o tirano no poder, compelindo a população a confiar nele para a sobrevivência. Portanto, como tem sido salientado a anos, essas sanções minaram a esperança de que Saddam Hussein seguisse o caminho de outros tiranos assassinos não menos perversos do que ele. O que inclui uma terrível galeria de criminosos também patrocinados pôr aqueles que agora se encontram no leme de Washington, em muitos casos até os últimos dias do seu poder sangrento: Ceausescu, somente para mencionar um caso óbvio e pertinente. A decência elementar exigiria reparações maciças dos Estados Unidos; e na falta destas, pelo menos um fluxo de ajuda aos iraquianos, para que eles pudessem reconstruir o que foi destruído à sua maneira, e não de acordo com o que as pessoas em Washington e Crawford ditarem, estas acreditam na máxima de que o poder vem do cano de uma arma. Mas as questões são muito mais fundamentais e de longo alcance. A oposição à invasão do Iraque têm sido inteiramente sem precedente histórico. Pôr isso Bush teve que encontrar seus camaradas numa base militar americana em uma ilha, onde eles iriam estar à salvo de quaisquer meros mortais. A oposição pode estar focada na invasão do Iraque, mas suas preocupações vão muito além disso. Existe um medo crescente do poder americano, que é considerado a maior ameaça à paz em grande parte do mundo, provavelmente pôr uma grande maioria. E com a tecnologia de destruição agora disponível, rapidamente tornando-se mais letal e ameaçadora, a ameaça à paz significa a ameaça a sobrevivência. O temor ao governo dos Estados Unidos não é baseado somente nessa invasão , mas também em fatos históricos. Uma determinação declarada abertamente de dominar o mundo pela força, dimensão essa na qual os Estados Unidos é supremo, e para ter certeza que nunca haverá nenhum desafio à essa dominação. Guerras preventivas devem ser combatidas à vontade: preventivas, não preventivas (ato para prevenir algo que com certeza vai acontecer). Quaisquer que sejam as justificativas que possam existir para um guerra preventiva, elas não se sustentam em relação à guerra preventiva que é uma categoria muito diversa: o uso de força militar para eliminar uma ameaça inventada ou imaginada. O objetivo abertamente anunciado é de prevenir uma ameaça ao "poder, posição e prestígio dos Estados Unidos". Tal ameaça agora ou no futuro, e qualquer sinal de que ela possa emergir, será confrontado com uma força esmagadora pêlos governantes do país que agora aparentemente gasta muito mais do que o resto do mundo inteiro junto em métodos de violência, e está forjando caminhos novos e muito perigosos contra uma oposição mundial quase unânime: o desenvolvimento de armamentos espaciais letais no espaço, pôr exemplo. Vale a pena ter em mente que as palavras mencionadas não são palavras de Dick Cheney ou Donald Rumsfeld ou outros estadistas agora no poder. Elas são , mais exatamente, palavras do respeitável estadista senior Dean Acheso, à quarenta anos atrás, quando ele era o conselheiro senior da administração Kennedy. Ele estava então justificando as ações dos Estados Unidos contra Cuba - sabendo que a campanha terrorista internacional dirigida à uma "mudança de regime" tinha trazido o mundo próximo `a uma guerra nuclear final. Apesar disso, ele instrui a Sociedade Americana de Direito Internacional de que nenhuma "questão legal" se origina no caso de uma resposta à um desafio ao seu poder, posição e prestígio," especificamente os ataques terroristas e uma guerra econômica contra Cuba. Eu menciono isso como um lembrete de que essas questões estão profundamente enraizadas. A atual administração está no limite extremo no espectro do planejamento de políticas, e o seu aventureirismo e pendor pôr violência são perigosamente incomuns. Mas o espectro não é assim tão vasto, e a menos que essas questões profundamente enraizadas sejam endereçadas, nós podemos estar confiantes de que outros extremistas ultrareacionários irão conquistar o controle de meios incríveis de devastação e
repressão.

A "ambição imperial" dos atuais donos do poder, como são francamente chamados, tem provocado estremecimento no mundo todo incluindo as principais correntes do sistema estabelecido em nosso país. Em outras partes, logicamente, as reações são muito mais temerosas, particularmente entre as vítimas tradicionais. Eles aprenderam muito da história na própria pele, para ser consolados com retórica. Eles ouviram o suficiente sobre isso ao longo dos séculos enquanto eram espancados pelo cacetete chamado " civilização." Alguns dias atrás, o chefe do movimento dos não-aliados, que inclui os governantes da maior parte da população do mundo, descreveu a administração Bush como sendo mais agressiva que Hitler. Ele na verdade é bem pró-americano e está bem no meio dos projetos econômicos internacionais de Washington. Existem poucas dúvidas de que ele fala pôr muitas das vítimas tradicionais, e agora por muitos dos seus opressores tradicionais. È fácil estender-se, e importante pensar detalhadamente nessas questões, com cuidado e honestidade. Mesmo antes da administração Bush provocar a rápida escalada desses temores nos últimos meses, especialistas em inteligência e assuntos internacionais estavam informando a quem quer que quisesse ouvi-los de que as políticas que Washington esta perseguindo podem levar à um aumento do terror e à proliferação das armas de destruição em massa, pôr vingança ou simplesmente para servir de freio. Há duas maneiras de Washington responder às ameaças engendradas pôr suas ações e proclamações alarmantes. Uma maneira é tentar aliviar essas ameaças prestando atenção à queixas legítimas e concordando em tornar-se um membro civilizado da comunidade mundial, com algum respeito à ordem mundial e suas instituições. A outra é construir máquinas ainda mais apavorantes de destruição e cominação, para que qualquer desafio percebido, ainda que remoto, possa ser esmagado - provocando novos e maiores desafios. Esse caminho propõe sérios perigos às pessoas nos estados Unidos e no mundo, e pode , muito possivelmente , levar a extinção da espécie o que não é uma especulação vã. No passado uma guerra terminal foi evitada quase pôr milagre, alguns meses antes do discurso de Acheson, mencionando um caso que está fresco na nossa memória hoje. As ameaças são severas e se amontoam. O mundo tem boas razões para assistir o que está acontecendo em Washington com temor e estremecimento. As pessoas que estão em melhor posição para abrandar esses temores e para levar à um caminho mais esperançoso e construtivo no futuro, são os cidadãos dos Estados Unidos, que podem moldar o futuro. Estas estão entre as preocupações profundas que, penso, devam ser mantidas muito claras em mente, enquanto observamos o desenrolar imprevisível dos eventos onde a mais terrível força militar na história humana é desencadeada contra um inimigo sem defesa pôr uma liderança política que compilou uma ficha assustadora de destruição e barbarismo desde que tomou as rédeas do poder há mais de 20 anos.

Noam Chomsky

 


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